segunda-feira, 18 de agosto de 2014

23% das mulheres viciadas em crack engravidaram 2 ou 3 vezes, diz estudo


40% das pessoas dizem não usar preservativo, diz Ministério da Justiça.
Reportagem do MGTV flagrou grávidas fumando a droga à luz do dia.

Do G1 MG, com informações do MGTV 1ª Edição
Pesquisas recentes apontam que os homens são maioria entre os usuários de crack. Mas as mulheres começam a aparecer cada vez mais nas estatísticas, vendendo ou consumindo a droga. Entre elas, é alto o número de gestantes. Um estudo feito pelo Ministério da Justiça aponta que, das mulheres viciadas em crack que responderam a pesquisa, 23% afirmam ter engravidado de duas a três vezes. Outras 17% dizem ter ficado grávidas uma vez; e 6,5%, quatro vezes ou mais. No levantamento, 40% das pessoas ouvidas informaram não ter usado preservativo em nenhuma das relações sexuais, no mês anterior ao estudo.
(Desta segunda-feira (18) até a quarta-feira (20), o MGTV 1ª Edição exibe a série de reportagens "Nascidos do Crack", que mostra o drama de mães que não conseguem abandonar o vídeo e as consequências para a saúde dos bebês)
Em Belo Horizonte, a equipe de reportagem flagrou o comércio de entorpecentes feito à luz do dia, livremente. As mulheres são as que mais aparecem pra comprar as pedras. Muitas delas têm acesso à informação. No entanto, dominadas pelo vício e sob efeito dos entorpecentes, se arriscam. Equipes de serviços públicos de saúde e integrantes de Organizações Não-Governamentais (ONGs) percorrem as “cracolândias” e tentam as mães sobre a importância do pré-natal. Mas encontram muita resistência.
Muitas vezes a mulher fica com dois homens por causa de R$5. Por quê? Pra manter o vício"
Marciléia, usuária de crack
Juliana Silveira é dependente química e mãe de dez filhos. Os repórteres a encontraram em um dos pontos de droga de Belo Horizonte. Grávida de sete meses, ela espera mais um menino. Quando questionada sobre o destino dos filhos, ela apenas chora. Mas não nega o uso da droga. Outra gestante é vista em outro ponto de drogas, localizada na Avenida Antônio Carlos. Ela coloca pedras de crack no cachimbo e acende. Pouco tempo depois, outro cachimbo e mais um longo trago. Em meia hora, ela fuma pelo menos três vezes.
Marciléia faz parte do grupo de usuárias e convive com um grupo de apoio a mulheres que passam por essa situação. Ela deu à luz Vitória. Em entrevista ao MGTV, ela conta já ter engravidado seis vezes. Entre as gestações, ela contabiliza três abortos. “É complicado porque a gente não se previne. Você só quer o dinheiro pra manter o vício. Muitas vezes a mulher fica com dois homens por causa de R$5. Por quê? Pra manter o vício”, revela Marciléia.
Sobre o destino da criança, a mãe da pequena Vitória conta: “entreguei pra minha irmã, minha irmã vai cuidar. Ela tem um quarto, do bom e do melhor. (...) Estou depressiva, não aguentei a pressão muito. Estou usando cocaína”.
Usuária de crack grávida, na série de reportagens do MGTV 1ª edição 'Nascidos do crack' (Foto: Reprodução/TV Globo)Usuária de crack grávida, na série do MGTV 1ª edição
'Nascidos do crack' (Foto: Reprodução/TV Globo)
Gravidez de alto risco
O desafio das equipes de saúde é levar as gestantes até os consultórios médicos. Pelo consumo do crack, a gravidez é considerada de alto risco. A falta de acompanhamento pode gerar consequências graves para a mãe ou para bebê e até levar à morte. A obstetra Raquel Tavares explica que além dos riscos habituais a qualquer gestante, como pré-eclampsia e diabetes gestacional, as dependentes químicas têm o risco da intoxicação pela droga. “O crack causa sobrecarga cardíaca, pode levar ao enfarte, a distúrbios hemorrágicos. A gestante usuária tem risco maior de apresentar sangramento depois do parto”, analisa.
Lei de planejamento familiar não se aplica à dependentes químicos
A lei do planejamento familiar no país, de 1996, obriga hospitais a cumprirem uma série de exigências para submeter as mulheres ao processo de esterilização; ou seja, uma cirurgia que impede novas gestações. A regulamentação não permite, no entanto, que usuárias de drogas passem por esse processo, mesmo que elas queiram. A legislação considera que essas mulheres têm o emocional alterado ou incapacidade mental temporária ou permanente.
A gente não preocupa com saúde da gente. A gente preocupa em sustentar o vício. Não tem aquela razão, vou no médico, vou fazer exame. Você só busca droga, droga, droga"
Jordânia, ex-usuária de drogas
Ajuda para largar o vício
O Hospital Júlia Kubitscheck oferece ajuda às grávidas que querem largar o vício. As gestantes podem morar em uma casa onde encontram apoio de psicólogos, assistentes sociais e enfermeiros.
Jordânia é uma das acolhidas neste espaço e conseguiu vencer as crises de abstinência. Ela conta que estava totalmente debilitada quando engravidou; com desidratação e problema pulmonar. Além disso, por ter bronquite, as condições de saúde foram agravadas. As fotos retratam esse período. Jordânia pesava 46 quilos. “A gente não preocupa com saúde da gente. A gente preocupa em sustentar o vício. Não tem aquela razão, vou no médico, vou fazer exame. Você só busca droga, droga, droga”, relembra.
Jordânia só largou o crack na metade da gravidez, depois de uma pneumonia. O filho nasceu de parto normal, pesando quase quatro quilos. No papel de mãe, ela encontra forças para se manter longe do crack, um inimigo que ainda ameaça.
“Eu quero recuperar tudo que eu perdi e estou caminhando para isso. Vontade até deu depois que eu ganhei o menino. Só que aí eu já estava com vontade de viver, recuperar as coisas que eu perdi”, comenta a luta pela superação.
As mães Marciléia, Jordânia e Juliana sabem exatamente quando tudo começou. O depoimento de Juliana retrocede ao ponto de início dessa trajetória nas drogas. “Se eu pudesse ter assim a máquina do tempo? Eu iria parar no dia 15 de março de 1998”, conta ela. E acrescenta, ao ser questionada sobre o que ocorreu nessa data: “o primeiro cachimbo de crack”.

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