O pré-candidato republicano à presidência dos Estados Unidos, Mitt Romney, e seus assessores, podem estar achando que sua viagem ao Oriente Médio e à Europa tenha sido um sucesso – levando em conta a direita que baba nos Estados Unidos, ou sua correligionária Fox News.
Mas a maior parte da mídia européia considerou essa tournée um rotundo fracasso, marcada por gafes e mais gafes, ou declarações fora do lugar.
Para começo de conversa, Romney, ao desembarcar em Londres disse (até hoje não se sabe o porquê) que a Inglaterra poderia não estar preparada para a realização de uma Olimpíada, o que provocou reações azedas por parte do primeiro ministro David Cameron.
A seguir, Romney foi a Israel, esperando agradar o eleitorado judaico nos Estados Unidos que, segundo pesquisas, têm manifestado uma preferência majoritária por Barack Obama. Mas deixou atrás de si uma coleção de novas farpas. Primeiro disse que a capital israelense deveria ser Jerusalém, não Tel Aviv. Chegou a dizer que moveria a embaixada norte-americano para a cidade multissanta – retirando-a, portanto, da capital de hoje.
Não só isso desagradou os palestinos, como criou uma situação embaraçosa, porque nem mesmo os Estados Unidos reconhecem de jure a ocupação do lado leste da cidade. Embora Jerusalem abrigue todas as instituições do governo israelense (residência e gabinete do primeiro-ministro, Parlamento e Suprema Corte), não há nenhuma embaixada estrangeira na cidade, porque a ocupação do lado leste da cidade foi conseqüência da guerra de 1967, e a comunidade internacional, nem a ONU, a reconhecem como legal.
Para completar, Romney declarou que o sucesso econômico de Israel se deve a sua “cultura”, conotando uma superioridade cultural que levantou suspeitas de racismo. Além disso, atribuiu esse mesmo sucesso à intervenção da “Providência Divina”, ressoando fundamentalismos religiosos, além de demagogia barata.
Mas ainda houve mais: o apogeu da campanha de Romney em Israel se dividiu entre sua visita ao Muro das Lamentações, em Jerusalém, e a realização de um almoço para arrecadação de fundos, a 25 mil dólares por cabeça, com 40 presentes. Isso, se lhe rendeu US$ 1 milhão, deixou aquele rastro de “candidato dos ricos” por detrás.
Nas suas declarações Romney se limitou a dizer que apoiava as acusações de Israel contra o Irã. Porém, um de seus assessores complementou a declaração dizendo que um governo Romney apoiaria uma ação militar unilateral de Israel contra o Irã. O bafo quente da guerra acompanhou a fala da campanha.
De volta à Europa, Romney foi à Polônia, à convite de Lech Walesa, hoje um líder de direita – inclusive no plano religioso – em contraposição àquele personagem que foi tido como um fino herói do Solidariedade. O encontro dos dois, em que Walesa, que recusou um encontro no passado com Barack Obama, desejou sucesso à campanha do pré-candidato, foi seguido por uma áspera declaração dos atuais líderes do Solidariedade dizendo que não compactuavam com a preferência daquele por Romney. Ao contrário, sabe-se que os “Solidarnösc” de hoje preferem Obama, graças, pelo menos, ao viéis claramente anti-sindical de Romney.
É claro que a ida de Romney à Polônia também se contrapunha à vinda de Obama a Berlim, quando era candidato, recuperando a imagem de John Kennedy em 1961. E o pré-candidato de hoje aproveitou para dirigir uma série de farpas contra Putin e a Rússia, falando em falta de democracia e proximidades com o Irã e Hugo Chavez, o abominável homem dos trópicos para o pensamento conservador.
Ora, acontece que, de fato, Putin não é uma preferência da mídia européia, que o aponta como despótico, tirânico, e no limite como suposto suspeito da eliminação de adversários e críticos. Porém a política de distensão de Obama em relação à Rússia é cara a essa mesma mídia. Dessa vez a retórica de Romney trouxe à tona o bafo gelado da Guerra Fria, que ninguém deseja mais que sopre no inverno econômico da Europa e da Zona do Euro, que nào se sabe se está em derretimento ou em congelamento.
Enfim, quod erat demonstrandum, um rotundo fracasso, que levou algumas vozes da mídia a levantar a hipótese de que Romney não está mesmo pessoalmente qualificado para o que almeja.
Flávio Aguiar é correspondente internacional da Carta Maior em Berlim.
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