segunda-feira, 28 de maio de 2012

Nasce uma usina à prova de terremotos

ISTOÉ teve acesso às obras de Angra 3 e revela os segredos que podem fazer dela uma das usinas mais seguras do mundo

Michel Alecrim
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PROTEÇÃO
Um quebra-mar protege o terreno contra ondas de até 4,5 metros de altura e a
estrutura foi projetada para suportar um terremoto de até 7,5 graus na escala Richter
Quem passa pela translitorânea BR-101, na parte que margeia o sul do Estado do Rio de Janeiro, já vê metade do prédio do reator da usina nuclear Angra 3, pronto para receber sua característica cúpula de concreto. Depois de 30 anos de espera, cercada de sigilo e polêmicas, a expectativa é de que a unidade comece a gerar energia no fim de 2015. A reportagem de ISTOÉ esteve no local e viu um frenético campo de obras tocadas por três mil operários, que trabalham em turnos dia e noite. Para o que se espera de um centro de abastecimento de energia, as dimensões são até modestas, o diâmetro do prédio principal é de 56 metros e a altura chegará a 65 metros. Mas vários detalhes impressionam, como a galeria que formará caminho subterrâneo, inclusive passando dentro de uma rocha, para que as águas do mar entrem e possam resfriar a usina. Paradisíaca, a praia está separada de turistas e moradores de Angra dos Reis apenas por uma montanha, atrás da qual fica um dos resorts mais sofisticados do balneário, o Hotel do Frade. Mas os prognósticos tranquilizam a vizinhança: Angra 3 será uma das primeiras usinas a ser construída após o trágico acidente de Fukushima, no Japão (2011), e pode ser considerada uma das mais seguras do mundo.

O terceiro reator da central instalada em Angra será totalmente controlado com equipamentos digitais e terá condições de se manter funcionando, mesmo se uma catástrofe parecida com a de Fukushima – terremoto seguido de tsunami – ocorrer no Brasil. Em qualquer processo industrial, 60% das falhas têm como motivo fatores humanos. Com a tecnologia digital, a operação fica mais independente e mais segura, diz o pesquisador Aquilino Senra, vice-diretor do Instituto Alberto Luiz Coimbra de Pós-Graduação e Pesquisa de Engenharia (Coppe), da UFRJ. Senra ressalta que o Brasil não está sujeito a tragédias naturais como as ocorridas no Japão, mas aprendeu com a tragédia do país asiático. O prédio principal é o que vai abrigar o reator. É a estrutura mais protegida do complexo, por ser o local onde o combustível nuclear ficará armazenado e onde ocorrerá a fissão que gera energia. A proximidade de Angra 3 com o mar requer cuidados especiais para que nem o movimento das marés nem qualquer onda cause acidente. Por isso, um quebra-mar protege o terreno contra ondas de até 4,5 metros de altura. A estrutura também foi projetada para suportar um terremoto de até 7,5 graus na escala Richter. Neste caso, no entanto, a hipótese é mais do que remota, pois não há registro desses fenômenos no País. 

Outra inovação na usina está sendo avaliada junto à Comissão Nacional de Energia Nuclear (Cnen). Tendo em vista o colapso no fornecimento de energia em Fukushima, que causou o superaquecimento do reator, estuda-se a introdução de um sistema móvel em Angra 3, que seria acrescido aos já projetados. Numa hipótese remota de um maremoto que danificasse todos os sistemas de emergência, geradores a diesel externos entrariam em ação. “Os sistemas de refrigeração do núcleo do reator em Fukushima e em Angra são diferentes. Mas aquele acidente nos obrigou a fazer uma extrapolação nas avaliações de risco”, afirma Alexandre Gromann, coordenador-geral de Reatores Nucleares da Cnen.
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DIGITAL
O reator de Angra 3 será controlado com equipamentos digitais
e terá condições de funcionar, mesmo em caso de catástrofe
Ao caminhar por dentro do prédio de concreto, vê-se já a montagem das chapas de aço que formarão a cápsula para envolver o reator. Mas a etapa que está mais avançada é a do prédio do gerador, uma das quatro obras que vão rodear o central, cujas paredes de concreto estão praticamente prontas. Nele é que o vapor produzido pelo reator movimentará as turbinas que geram energia. Quem entra no setor percebe a importância das variações de temperatura da água para a produção de energia elétrica. Imensas galerias na parte baixa dessa estrutura terão ligação com o mar, cuja função será resfriar o sistema. A vazão de água marinha prevista equivale a uma vez e meia à da estação de tratamento do Rio Guandu, que abastece a Região Metropolitana do Rio.

O superintendente da construção Eletronuclear, José Eduardo Costa Mattos, é o principal responsável por conciliar todas as exigências de segurança com o rigoroso cronograma. Segundo ele, a estrutura do prédio anexo da turbina, onde a energia efetivamente é gerada, está quase pronta, com 35% das obras civis realizadas. “Por conta de uma greve de operários no início do ano, teremos que fazer um ajuste no cronograma, mas o prazo final não será alterado”, afirma o engenheiro, que participou da construção das duas usinas anteriores.

A questão que ainda não está resolvida no projeto é seu licenciamento ambiental. O Ibama concedeu a licença de instalação em 2009, o que permitiu o início das obras. No entanto, uma série de condicionantes teriam que ser cumpridas até a licença definitiva. Uma delas é a construção por parte da Eletronuclear de uma rodovia entre Paraty (RJ) e Cunha (SP). A pavimentação da estrada é necessária para criar uma nova rota de fuga, em caso de acidente nuclear. A obra, estimada em R$ 66 milhões, ainda depende de finalização de estudo do próprio Ibama. Os responsáveis pela obra, no entanto, estão otimistas. Estão convencidos de que a parte burocrática não irá atrapalhar o início do funcionamento da usina pós-Fukushima tida como uma das mais seguras do mundo.

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