Um relatório do Conselho Regional de Medicina do Rio de Janeiro
(Cremerj), com dados sobre vistorias de 16 UPAs no Grande Rio -
sendo 8 na Baixada Fluminense - indica uma série de problemas nas
unidades. O G1 teve acesso ao documento, que indica a presença de irregularidades como médicos e profissionais de enfermagem
sobrecarregados, falta de medicamentos e equipamentos
quebrados.
As vistorias começaram em setembro de 2016, com o objetivo de
saber quais são as condições de trabalho dos profissionais de
saúde e de atendimento aos pacientes. Desde então, 16 UPAs
foram vistoriadas no Grande Rio, sendo 8 delas na Baixada
Fluminense.
De acordo com o vice-presidente do Cremerj, os problemas
acontecem tanto nas UPAs municipais quanto estaduais. A crise
no Estado do Rio de Janeiro influenciaria a crise nas duas esferas
de governo, já que as unidades municipais também dependem de
repasses do poder estadual.
“A situação das UPAs na Baixada Fluminense é extremamente
preocupante. Temos três UPAs fechadas. Em Jardim Íris, em São
João de Meriti; a de Comendador Soares [em Nova Iguaçu] e de
Nilópolis. As que estão abertas estão com deficiência de médicos,
enfermeiros, falta de segurança, de insumos, de medicamentos,
de reposição do material. As condições são extremamente
precárias. A população da Baixada não tem muito para onde correr
hoje em relação a essas UPAs”, explicou Nelson Nahom, vice-
presidente do Cremerj.
A Prefeitura de Nilópolis também se pronunciou e afirmou que a
UPA do município não foi fechada. Segundo o órgão, ela foi
transferida para o primeiro andar do novo hospital Juscelino Kubitsheck
e está funcionando normalmente, 24h. De acordo com a prefeitura,
a gestão anterior fechou a UPA pediátrica.
Nahom também destaca que não apenas as UPAs, mas também
outras unidades de saúde básica também estariam com problemas
no atendimento à população. Ele destaca o fechamento de unidades
básicas de saúde em Japeri e em Nova Iguaçu. De acordo com o
Cremerj, o problema pode fazer com que aconteça uma procura ainda
maior das emergências dos hospitais.
“O que acontece é que eles [os pacientes] vão acabar procurando e sobrecarregando de forma gigantesca o Hospital da Posse ou vão vir
ao Rio de Janeiro atrás de socorro”, explicou o vice-presidente do
Cremerj.
No dia 10 de janeiro, o prefeito do Rio, Marcelo Crivella, já tinha
comentado que temia a sobrecarga da rede municipal de saúde
com a crise no Estado do Rio de Janeiro, mas que estava conversando
com o governador Luiz Fernando Pezão e seus secretários para que a
atuação dos dois poderes seja unida, principalmente no verão, com a possibilidade de aumento no número de casos de doenças causadas
pelo Aedes Aegypti.
Dificuldades no atendimento
Na UPA do Cabuçu, em Nova Iguaçu, a vistoria verificou que não havia
Na UPA do Cabuçu, em Nova Iguaçu, a vistoria verificou que não havia
médico de rotina. Assim, todos os pacientes eram atendidos pelos
médicos plantonistas, aumentando o volume de atendimento e fazendo
com que o tempo de espera dos pacientes fosse maior.
O número de enfermeiros e técnicos de enfermagem também era
menor do que o necessário, também prejudicando a qualidade do
atendimento.
O mesmo problema se repete em outra UPA em Nova Iguaçu, na
Estrada de Adrianópolis. Lá, os médicos também atendem mais
pacientes por hora do que o recomendado pela portaria 2079/2014
do
Conselho Federal de Medicina, que determina que o volume de
atendimento não ultrapasse 3 pacientes para cada médico.
Tanto na UPA do Cabuçu quanto na de Adrianópolis, o Cremerj
afirma ter constatado a permanência de pacientes internados por
mais de 24 horas nas unidades - elas deveriam cuidar somente de
atendimentos imediatos. O motivo das internações seria a falta de
leitos disponíveis nos hospitais da região.
“Você vai encontrar pacientes por sete ou oito dias na sala vermelha
e por 20, 30 dias na sala amarela”, destacou Nahom.
Os problemas se repetem em outra UPA, na Praça Camarim, em
Queimados. De acordo com o relatório do Cremerj, os pacientes
que estão internados no local permanecem sem avaliação aos
domingos, já que há déficit em plantonistas.
Outro problema encontrado na vistoria foi o que o laboratório
credenciado para exames laboratoriais opera somente 12 horas
por dia, no período diurno e, ainda assim, de maneira parcial. Na
prática, os médicos são obrigados a realizar boa parte dos
diagnósticos sem nenhum exame complementar. Os pacientes mais
graves têm exames feitos no Hospital da Posse.
Ainda segundo o Cremerj, as UPAs vistoriadas não contam com
ambulâncias, o que dificulta remoções de emergência já que ficam
estacionadas em outras unidades e, quando solicitadas, chamadas
até a unidade que precisa delas. O médico que realiza as remoções
com a ambulância é das próprias unidades, o que aumenta ainda
mais o problema de falta de médicos até o seu retorno.
Em todas as unidades vistoriadas foram encontradas alguma forma
de desabastecimento de medicamentos. Em alguns casos os
médicos dispunham de medicamento para uso interno, mas caso prescrevessem para os pacientes, eles não poderiam retirá-los nas
farmácias das unidades.
Na UPA de Comandador Soares, em Nova Iguaçu, fechada na
última sexta-feira (13), o caso também é grave, como informou o
vice-presidente do Cremerj na data.
“Verificamos que a UPA, que tinha 15 mil atendimentos por mês em
setembro, estava fechada agora. Tinha só um clínico pediatra e desde
outubro ela não está recebendo nenhum medicamento. O estoque
estava completamente zerado e não tinha como atender. Só em
casos extremamente grave, mas ainda assim sem como atender",
explicou Nelson Nahom.
Nas unidades de Adrianópolis e de Cabuçu, os fiscais do Cremerj
encontraram falta de monitores cardíacos, ventiladores mecânicos
e respiradores que estavam em manutenção.
Na UPA de Queimados, os aparelhos de ar condicionado não
funcionavam ou estavam quebrados. A sala de sutura funciona sem
material de higienização. O armário onde os materiais deveriam ser armazenados estava quebrado. Há falta de fios cirúrgicos, principalmente
para crianças.
A situação se repete nas imagens da UPA do Parque Lafaiete, em
Duque de Caxias (veja vídeo). É possível ver prateleiras e geladeira
de medicamentos vazias e consultórios desativados.
O Cremerj também questiona a portaria do Ministério da Saúde que
permite aos gestores municipais definir e escolher a capacidade de
atendimento das unidades a partir de oito opções de funcionamento
operacional, vinculando os repasses de custeio à quantidade de
profissionais em atendimento, e não por porte da unidade. O conselho
acredita que isso faria com que a população fosse pior atendida, pois
menos profissionais estariam disponíveis nas unidades.
Procurado pelo G1, a Prefeitura de São João de Meriti, que administra
a UPA de Parque Íris, informou que a UPA da cidade está fechada
desde novembro de 2014. Eles afirmaram que sendo feito um esforço
para reabrir. O local vai ser limpo e receberá equipamentos. O local vai
reaberto como UPA infantil.
A Prefeitura de Duque de Caxias, responsável pela UPA de Parque
Lafaiete, informou que pretende melhorar o sistema de saúde do
município e que a cidade conta com R$ 400 milhões de dívidas
herdadas de gestões passadas e mais de três meses de salários
atrasados dos servidores do município. A gestão informou ainda que
encontrou a cidade desabastecida de medicamentos e com uma
dívida de R$ 14 milhões com a empresa terceirizada responsável
por retirar o lixo da cidade. Eles informaram também que já pagaram
os salários de janeiro e pretendem amortizar as dívidas e regularizar
a situação da rede de saúde do município.
Governo do Estado responde
O G1 questionou o governo do Estado sobre os problemas apontados
O G1 questionou o governo do Estado sobre os problemas apontados
pelo Cremerj em UPAs sobre sua responsabilidade. A coordenação da
Unidade de Pronto Atendimento de Cabuçu informou que não há falta de medicamentos para atendimento aos pacientes dentro da unidade e
também não procede a alegação de número de enfermeiros e técnicos
de enfermagem abaixo do necessário - segundo a secretaria, o
quantitativo de pessoal de enfermagem (quatro enfermeiros e sete
técnicos) atende a previsão contratual referente à unidade.
A coordenação acrescenta que não há previsão contratual para
médico de rotina nas Unidades de Pronto Atendimento. A pasta ainda
alegou que todos os pacientes que necessitam de remoção são
regulados e transferidos de acordo com suas condições clínicas e
liberação de vagas.
A coordenação da UPA de Nova Iguaçu II informou que todos os
pacientes que necessitam de remoção são regulados e transferidos
de acordo com suas condições clínicas e liberação de vagas, e
acrescenta que não há falta de medicamentos para atendimento aos
pacientes dentro da unidade. A coordenação negou também a
denúncia de descumprimento da portaria 2079/2014. "No mês de
dezembro do ano passado, por exemplo, foi realizada uma média de
12 atendimentos por hora, por um corpo clínico formado por oito
plantonistas", disse a nota.
A coordenação da UPA de Queimados afirmou que não procede a
denúncia de medicamentos vencidos. Os materiais de higienização
e fios cirúrgicos são recebidos semanalmente. A coordenação
acrescenta que já foi providenciado o reparo para a gaveta do armário
e informa que o quantitativo médico está de acordo com o previsto em
contrato.
O município de Nova Iguaçu informou que a A UPA de Comendador
Soares está fechada desde dezembro, na gestão anterior, devido à
falta de pagamento dos funcionários contratados da Saúde ( novembro, dezembro e 13° salários) e de medicamentos e insumos. Ainda de
acordo com a nota, a antiga gestão não deixou processos que
possibilitassem a compra dos insumos, que estão sendo adquiridos
agora, em caráter emergencial.
A prefeitura de Queimados foi procurada e informou que a UPA do
município é de responsabilidade do governo do Estado.
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