Parlamentar fez críticas à proposta defendida por Eduardo Cunha (PMDB)
O deputado federal Jean Wyllys (PSOL-RJ) reagiu nesta sexta-feira às declarações do presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), que ontem prometeu urgência em votar o projeto de lei que torna a “cristofobia” crime hediondo . De autoria do deputado Rogério Rosso (PSD-DF), o texto aumenta a pena de ultraje a culto para até oito anos de prisão. Para Jean, coordenador da Frente Parlamentar Mista pela Cidadania LGBT da Câmara e integrante da Comissão de Direitos Humanos e Minorias, Cunha “é um sacripantas” em defender a proposta.
“Para mim, uma pessoa que investe em uma pauta conservadora, que alimenta ódio e estigma sobre segmentos da população para criar uma cortina de fumaça que esconda as denúncias de envolvimento dele em denúncias de corrupção é um sacripantas”, disse. Cunha foi um dos mais de 40 denunciados pela Procuradoria Geral da República, em março passado, no escândalo da operação Lava Jato. O peemedebista, no entanto, nega participação no esquema de corrupção investigado na Petrobras.
Jean foi um dos palestrantes do ciclo de conferências “Cidades Rebeldes”, promovido em São Paulo pela editora Boitempo em parceria com o Sesc. Hoje, ele foi uma das atrações na palestra “Que cidade queremos? Apontamentos para o futuro da cidade”, ao lado da psicanalista Maria Rita Kehl, da urbanista Ermínia Maricato, do escritor Paulo Lins e do secretário de Cultura do município, Nabil Bonduki. O encontro foi mediado pelo jornalista Leonardo Sakamoto, da ONG Repórter Brasil.
O requerimento de urgência em relação ao projeto da “cristofobia” foi protocolado ontem pelo deputado Rogério Rosso (PSD-DF), autor do texto que endurece o tema. “Se tiver a urgência dos líderes, eu ponho para votar”, disse Cunha em entrevista a jornalistas. O regime de urgência acelera a tramitação da proposta na Casa.
Para Jean, o projeto não deve ir adiante “porque é inconstitucional”. “É uma jogada demagógica e é um projeto inconstitucional, porque o Estado brasileiro é laico e não privilegia nenhuma religião em detrimento das outras – é feito de judeus, muçulmanos, devotos religiosos de matrizes africanas, cristãos católicos, evangélicos e ortodoxos, além de agnósticos e ateus, ou seja, o Estado não dá prioridade a nenhuma das religiões”, argumentou o parlamentar. “Dar um tipo penal à ‘cristofobia’ é priorizar a religião cristã, e, além disso, ‘cristofobia’ nem existe, é um delírio de Cunha: na verdade, é um escárnio até com uma causa histórica da comunidade LGBT pela criminalização da homolesbotransfobia”, comparou.
O psolista afirmou que há deputados dispostos a pedir a inconstitucionalidade da matéria no Supremo Tribunal Federal (STF), caso ela passe no Congresso, mas observou que mesmo parlamentares poderiam ficar sujeitos ao aumento da penalidade.
“O primeiro preso a amargar pena maior de prisão proposta por esse projeto de lei seria [o deputado federal] Marco Feliciano (PSC-SP), porque tem circulado um vídeo em que ele faz ofensas terríveis ao crucifixo católico em tampa de caixão, porta de cemitério e até no pescoço das pessoas, por exemplo. Acho lamentável que Eduardo Cunha entre nessa jogada da bancada de fundamentalistas religiosos por causa de uma representação artística na Parada LGBT e silencie, de outro modo, com pastores que já incitaram violência na TV contra religiões africanas”, criticou. “É uma jogada demagógica, por tudo isso digo: ele é um sacripanta”, reforçou.
Deputado dá "sugestão" a pais de alunos LGBT em SP
Jean também lamentou a comissão de finanças da Câmara de Vereadores de São Paulo ter retirado, esta semana, questões afetas a gênero do texto do plano municipal de educação, em tramitação no legislativo municipal desde 2012. Por oito votos a um, na última quarta-feira, a comissão conseguiu retirar do projeto expressões como “diversidade”, “gênero” e “travesti”.
“A Câmara de Vereadores de São Paulo reproduziu o que já tinha acontecido com o Plano Nacional de Educação [sancionado pela Presidência ano passado]: apesar de todo o debate em torno do plano, com a Comissão de Educação e depois de várias audiências públicas, um dos pontos que era considerado era alunos e professores na sua diversidade de orientação sexual e identidade de gênero. Mandamos para o Senado, e, lá, as igrejas fundamentalistas e a direita católica fizeram um lobby de modo que todo o texto foi modificado”, lembrou.
Na avaliação do parlamentar, os vereadores em São Paulo precisam ser cobrados pela atitude pelos pais dos alunos afetados pela retirada das questões de gênero.
“A atitude dos vereadores é lamentável, além de ser fruto de uma estupidez: não é negando a existência de identidade de gênero em um texto do plano de educação que eles vão conseguir eliminar da existência os homossexuais. Nós existimos, ainda que a lei não nos contemple. Acho que cada pai e mãe de lésbicas, gays e transexuais dessa cidade deveria escrever uma carta ou e-mail e mandar para esses vereadores estúpidos que fizeram essa modificação. Deveriam dizer a eles que são representantes da totalidade povo de São Paulo, que é diverso, feito de negros e brancos, nordestinos e paulistanos, nascidos aqui, de ricos e pobres, de gays, lésbicas, transexuais e travestis, pessoas sui generis... A Câmara tem que representar essas pessoas que contribuem com seus impostos”, sugeriu.
No evento em São Paulo, o parlamentar também lançou o livro sobre violência policial "Bala Perdida", pela editora Boitempo Editorial, assinado com outros 22 autores.